Estávamos em pé, do lado de fora, encostados à parede do prédio, o abismo aos nossos pés. Todo o cenário era estranho, o prédio desconhecido, não era o meu e nenhum dos seus. Conversávamos. Não me lembro o conteúdo da conversa, mas falávamos de nós. Discutimos. Você falava crueldades, aquele tipo de coisa que só falamos a quem amamos; não somos cruéis com quem não nos importa. Eu, apavorada, chorava. Você quase ria. Ridícula. Foi disso que você me chamou. Acreditei e te odiei. Odiei que você não entendesse que era tudo por você. Odiei que você entendesse que era tudo por você, e por isso ficasse tão irritado. Odiei não entender nada e me exasperei quando você disse que também não entendia. Pausa. Silêncio. Suposta calma. Tento reconciliar – porque acho que não sei fazer outra coisa – e novamente a raiva. Tua e minha. Mais silêncio. Cansaço. Sozinha, sinto o desespero da espera. Certeza de que não sairemos dali vivos. O chão era muito pouco, qualquer passo em falso nos faria cair. Paraliso. Tenho medo de falar, pois falar é deslocar, e não quero morrer. Fico sozinha com meu medo, não arrisco aproximar-me de você. Mas te olho. Você sorri. Nós caímos.
7 comentários:
Ai, Carina. Você escreve a cada dia melhor, mais bonito, mais doído, mais.
Conheço esses lados: amor e crueldade de braços dados...
Bravo, Carina!
Que lindo, Carina.
Adorei o que li. Adorei o que senti ao ler.
"O vazio virou estrada."
É isso!
Viver é isso.
Mesmo quando não há final feliz.
Adorei, Cá!
Bjo, bjo,
Talita.
Descreveste um cenário de pseudo desespero ante as impossibilidades de criar certezas sobre sentimentos. E conseguiu. Até o final, ninguém espera de verdade que se salve. O precipício, o abismo, tudo parece real e hostil.
Apenas a coragem, o estímulo de amor que não tem volta, pode criar a estrada perfeita para passos eternos.
"eu perco o chão, eu não sei as palavras, eu ando tão triste, eu ando pela estrada.."
Gosto do palpitar deste coração...
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