Eu só sei escrever sobre amor. Sou uma pessoa doce, melosa e brega. Tudo que escrevo cai nesse mesmo tema. Será que é isso mesmo? Na verdade sou muito menos doce do que gostaria, ou do que acho que deveria ser. Sou chata, intolerante, e altamente crítica. E não só amo. Eu odeio, fico irritadíssima e sei ser muito má. Só que acho isso ruim, então tento disfarçar. Por exemplo, estava agora mesmo irritada por sentir que não tenho escrito nada de novo, e ao mesmo tempo dizendo que não consigo me imaginar escrevendo outra coisa. Quando me defino assim, essa pessoa que só fala de amor, acabo me limitando. Se eu sinto raiva, se odeio, por que não falar disso também?
Então me veio a seguinte formulação: o ódio movimenta o mundo tanto quanto o amor. Dizem que a fé move montanhas, mas mesmo os religiosos são altamente influenciados pelo ódio. Todo o terrorismo atual e as guerras “santas” da história estão aí para provar. Parece loucura pensar que diferenças provoquem ódio e que um sentimento gere tanta destruição. Talvez por isso a dificuldade de falar de ódio, e minha resistência até mesmo em pensar nisso. Mas o fato é que todos nós odiamos. E como há infinitas formas de amar, também há um sem número de maneiras de odiar. Acho que aí reside a principal questão: o vilão não é o ódio, é o que fazemos dele. Por exemplo, eu estava aqui agora muito irritada. Com raiva, odiando um monte de coisas, pessoas, e até a mim mesma. E daí eu comecei a escrever. E, enquanto escrevia, as palavras correndo, comecei a pensar em coisas novas, ficar curiosa comigo mesma, com as minhas acepções acerca do ódio e de outros sentimentos ruins. Então tão repentinamente como me tomou, o ódio me deixou. Claro que nem sempre é assim, e não é possível fazer disso uma fórmula: quando odiar, escreva. O que aconteceu agora comigo foi apenas uma das possibilidades de lidar com o ódio. Mas basta uma para mostrar que não é preciso temer o ódio, a raiva ou qualquer sentimento. Ocorre-me agora que o medo é inclusive um fator primordial do ódio. Quantos odeiam o diferente por terem medo dele? Do que eu tenho medo quando evito falar de sentimentos e sensações que julgo errados? Temo me desconhecer, temo que ao trabalhar com significantes novos eu me desencontre de quem acho que sou. Só que agora, depois de escrever essas linhas que ainda nem sei ao certo que efeito terão em mim, tenho a certeza de que foi bom me desencontrar. Porque só assim me encontrei nova. E saí do castelo de conto de fadas que eu mesma criara, mas que mais do que me proteger, me prendia.
11 comentários:
Ao ler este post lembrei-me (o que é o medo?) do livro "O Senhor Swedenborg e as investigações geométricas" de Gonçalo M. Tavares. Conheces?
Eu ja fiz esse exercício. E após um rompante de raiva, escrevi. E percebi algo novo e assustador. Minhas palavras podem machucar muito mais do que agradar. Tenho um "dom" em colocar intensidade seja pro bem ou não. E quando veio o ódio, eu exteriorizei. Nas letras. Vou te mostrar depois o texto. Sobre escrever sempre o mesmo tema, é, caimos nessa roda viva. Mas, existem maneiras e maneiras de se escrever, de se ler. Sua escrita é diferente, não tem nada a ver com a minha, porém o tema não é o mesmo? Entre outros. O que é legal, é interagir. Ler e ser lido, discutir. Se depender de mim, virei sempre discutir, divagar. Devagar. mas virei. (disse que me alongava né?!)
Acho que a gente acaba escrevendo mais sobre amor justamente pela consciência de que também, e às vezes até em rompantes de maior intensidade, odiamos...
Não sei, faz sentido? Nunca tinha parado pra pensar nisso...
Belo post, colocou todo mundo pra pensar! =]
Esse post me faz pensar em algo que tenho lentamente concluído nesses últimos tempos: como esse extremos se encontram tão próximos! Falar que ódio e amor são os dois lados da mesma moeda é até clássico já, né? Mas começo a achar que são a mesma moeda! Quantas vezes o ódio não esteve embutido no amor (ou vice-versa)? Na verdade, "ódio" e "amor" eu definiria como duas categorias imensas que abrigam uma infinidade de outros possíveis sentimentos, uns se sobrepondo aos outros em várias interseções ambíguas e contraditórias... Me lembra também que uma vez eu ouvi de alguém (?) que o ateu é o mais religioso dos homens. Talvez dentro do amor mais amplo esteja também o ódio mais fundo? rs. Não sei. Só sei que achei interessante você falar do amor como se ele fosse o impulso que move a sua escrita. A minha sempre foi movida bem mais por sentimentos nada amigáveis e obscuros. Queria eu saber escrever mais sobre amor, acho a leveza dele uma das coisas mais inatingíveis dentro da literatura! Talvez por isso eu fuja de escreve sobre ele, sempre me sinto nadando, nadando e morrendo na praia, rs.
Beijos, querida, adorei o post (deu pra perceber pelo tratado que escrevi, né?)
Sou extremamente complicada pra lidar com ódio. Não que eu não o sinta, mas ele dura pouco. Sou feita da mesma matéria das manteigas, me derreto com qqer calor humano e volto a amar. Melhor, descubro que nunca odiei. Algumas vezes o ódio é só o amor fazendo birra.
Beijo!
Odeio tudo aquilo que falta para o amor ficar completo. Mas, se completasse mesmo, não seria amor. Seria um tipo de felicidade plena, uma coisa que não existe, um nada.
Sinto que seu caso não é a temática. Você pode, nós sabemos bem, escrever sobre qualquer tema. Mas, você é exigente e só escreve um tema pelo qual você se sinta tomada.
Não é que você escreve só sobre amor, a verdade é que escreve só sobre o que você ama.
Ou odeia, né?! Talvez, haja um tanto de amor no odio.
Beijos!
É que o ódio tá tão perto do amor.
É que falar sobre amor é falar sobre tudo, ódio inclusive.
É que odiar faz uma pessoa tão verdadeiramente humana.
É que é bom descobrir em nós sentimentos que são nossos e que nem sabíamos.
E é tão bom escrever sobre isso.
E é tão melhor ler sobre isso.
Não adianta, Carina. Você escreve lindamente sobre tudo e qualquer coisa. Eu amei.
PS: Tenho odiado tanto algumas coisas, mas é um ódio tão preciso que - acho! - deve ser amor.
Né? rs.
Beijos, querida.
Gonçalo, Brecht... finalmente encontrei estar-me aqui, moça sensível do Rio de Janeiros...
Abraço mineiro,
Pedro Ramúcio.
The must!
Adoro essa escrita pulsional, com um quezinho de divã.
E no fim das contas acho que a gente só odeia aquilo que pode amar. E assim, o ódio também pode ser lindo. Como vc disse, depende do que é que a gente resolve fazer com ele.
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