Eu sonhava.
Eu fechava os olhos e sonhava, sem que você percebesse.
Sem que você percebesse, eu abria os olhos e sonhava o mesmo sonho.
Eu sonhava o mesmo sonho noite após noite, antes de dormir.
Antes de dormir você me beijava, e me prendia no seu abraço.
Você me prendia no seu abraço e então eu era livre para voar.
Eu era livre para voar, então eu fechava os olhos e pulava.
Eu pulava no abismo do sonho e não caía, eu voava.
Eu voava de olhos abertos, e sonhava.
Eu sonhava o mesmo sonho, no qual você me beijava e me prendia no seu abraço, sem nunca mais me soltar.
Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.
Tem frases que escrevo e que me perseguem. É sério: eu as escrevo, penso que me livrei, e, de repente, a frase ressurge como se fosse a primeira vez que... o que? Que a escrevi, que a ouvi, que a pensei? Não sei. Frases assim são como pedaços de real que passam por mim, me cortam, mas que não são minhas. Elas me atravessam e deixam essa marca que não cicatriza nunca, que sangra a cada vez que penso, que ouço, que escrevo.
Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.
Como assim calar por não poder falar tudo? É justamente por não conseguir falar tudo que eu falo. Falo, penso, escrevo, defino, grito, tudo tentando dizer o máximo que eu puder. Amor? Aí mesmo é que eu não me calo. Praticamente tudo que eu falo tem a ver com amor. Escrevo amor amor amor amor milhares de vezes tentando alcançar, entender, descobrir, saber o que é esse tal de amor que tanto me perturba.
Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.
Curiosamente lembrei agora de um dos primeiros posts do meu blog em que eu reclamava me calar por não saber falar de amor. E respondi à minha reclamação dizendo que o problema é que eu só falava do que sabia e organizava, e que era impossível organizar o amor. Parece-me que, daí em diante, resolvi que ia falar sobre amor até aprender. Então escrevi o amor em prosa e poesia, realidade e fantasia, felicidade e agonia, e ainda assim não entendi. Não entendo, não aprendo, continuo não sabendo.
Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.
E então, agora, esse calar. Que depois de tantas repetições (na minha cabeça e na tela do computador) me atinge de outra forma. É um calar diferente do calar por não saber ou do calar por conformismo de que não entenderei jamais o amor. Calei, no dia em que escrevi essa frase pela primeira vez, por me submeter ao fato de que não poderia explicar, e nem dizer tudo sobre o amor. Que mesmo tendo muito a dizer, mesmo tendo todas as palavras existentes e inventadas à minha disposição, ainda assim sobraria a falta. A falta, que é o que faz do amor, amor.
Calo-me agora. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que digo quando amo. E é por isso que amo.
*Texto originalmente publicado aqui.